domingo, 4 de novembro de 2012

SOMOS TODOS GUARANIS KAIOWÁS

No dia 8 de outubro, uma carta escrita pelos índios da etnia Guarani-Kaiowá, acampados no local que historicamente pertencia ao seu território Pyelito Kue (na região de Iguatemi/MS), ganhou projeção nacional. Na carta, eles protestavam contra a ordem de despejo decretada pela justiça do MS, que ordenava aos quase 200 indígenas que saíssem do pouco que sobrou de seu território. Diante de anos vendo o avanço dos latifundiários sobre suas terras, e conhecendo bem os métodos de seus exércitos de pistoleiros particulares e da própria polícia do MS, os Guarani-Kaiowá deixam uma mensagem clara na carta: haverá resistência, nem que isso leve ao extermínio de toda a etnia.

Diante da pressão exercida pela divulgação da carta, a justiça concedeu aos indígenas a permanência em até 1 hectare de terra na região (metade da área ocupada por eles atualmente, e quase nada se comparado aos 762 hectares da fazenda onde se encontra), e o Governo Federal deu declarações dizendo que agilizará o processo de demarcação das terras dos Guarani-Kaiowá. Essa demagogia do governo Dilma procura esconder a conivência do PT, em seus quase dez anos de governo, com a expansão dos latifundiários sobre os territórios indígenas, que são obrigados a fugirem de suas terras ou se sujeitarem ao trabalho semi-escravo nas fazendas dos grandes barões da soja. Enquanto propagandeia pequenas concessões, como a homologação da demarcação do território Raposa Serra do Sol pelo governo Lula, o Governo Federal mostra todo seu descaso com os povos originários ao atingir várias tribos com obras do PAC, como a construção da usina de Belo Monte e a pavimentação da BR-319, e o novo código florestal. 

Esta não é a primeira vez que a "Justiça" obriga os Guarani-Kaiowá a saírem de suas terras em nome do latifúndio. Enquanto aguardam terras "cedidas", ficam na beira de estradas em barracos, em uma situação degradante e insalubre. Líderes já foram assassinados, membros da tribo atropelados e recentemente houve o caso do estupro de uma índia por 8 jagunços. Os Guarani, particularmente os Kaoiwá, tem os maiores índices de suicídio entre jovens indígenas no Brasil, desde 2000 há 866 casos numa população de menos de 51 mil.

A expropriação das terras indígenas e o genocídio das tribos estão relacionadas ao desenvolvimento da economia brasileira, que é baseado principalmente no latifúndio e no trabalho precário, trabalho esse que se apoia no racismo estrutural do Brasil para se desenvolver. Não à toa o Brasil é um dos países com a maior concentração de terras e estatísticas de violência no campo, para manter a base da economia é necessário um verdadeiro genocídio dos povos que lutam por terra e, por extensão, contra os latifundiários que tem como representantes atualmente em Brasilia a bancada ruralista evangélica. As enormes concessões do Governo Federal a essa bancada, como o texto final do novo Código Florestal, demonstram os traços de continuidade que o governo do PT carrega de seu antecessor tucano, responsável por episódios como o Massacre de Eldorado dos Carajás em 1996.

A exploração e opressão que vivem os camponeses, negros e povos indígenas devem ser entendidos como parte do projeto de desenvolvimento econômico que desde os tempos remotos - na época de escravidão indígena e principalmente negra na colonização e posteriormente a Lei de Terras - os retira o direito a terra para não terem outra alternativa que não seja o trabalho em regime semi-escravo para os latifúndios ou a emigração para as grandes cidades (onde a precarização da vida também é uma constante), e nesse sentido, aniquilar de vez a resistência dos povos no campo. A luta pela determinação dos povos no Brasil, como dos Guarani-Kaiowá, é também a luta contra esse pilar do capitalismo do "Brasil Que Avança", que é esse modelo agrícola concentrador, monocultor e voltado ao mercado externo, erguido no Brasil ao longo de séculos de História às custas de muito sangue e suor negro e indígena.

Nas escolas, desde as primeiras séries o jovem brasileiro aprende que os povos indígenas eram dóceis, que construíram junto aos brancos uma nação multirracial e sem preconceitos. É a partir desse mito que se naturaliza o silêncio, ou melhor, silenciamento, dos Guarani-Kaiowá e de tantos outros povos oprimidos , um silêncio imposto principalmente pela mídia hegemônica que existe a serviço da burguesia e do latifúndio no Brasil. Isso somado à visão reacionária disseminada pela expansão imperialista no início do século XX: de que a história dos povos indígenas não está em suas próprias mãos, que existem e só podem existir enquanto sociedade na medida em que o capital impõe sua ''civilização'' e lhes ''da as ferramentas'' , que se tratam de sociedades inferiores que tem de avançar pelas mãos do homem branco. 

Os povos indígenas possuem e acima de tudo criam sua própria História e dela são seu único sujeito, e não lhes cabe ter os rumos decididos pelos aliciadores de força de trabalho barata para o agronegócio, como se revelou o SPI (Serviço de Proteção ao Índio na história do país, ou pelos latifundiários que assim como foram base do Brasil colonial, hoje com suas plantações de soja, são base para o novo ''Brasil potência''. A ideia de intervenção nas terras indígenas por parte do estado brasileiro, empresas, fazendeiros, ou seja quem for, é uma ideia essencialmente racista e etnocêntrica, alicerces por sobre os quais o país foi construído e sua história foi contada, uma história escrita por homens brancos, com o sangue negro e indígena. E a História, embasada na farsa dialética democracia racial x superioridade européia, agora, no caso dos Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue, está se repetindo como tragédia.

Os jovens e trabalhadores precisam ser convencidos da perspectiva essencial do direito a autodeterminação dos povos e prestar total solidariedade de seus coletivos, organizações e sindicatos, para os Guarani-Kaiowá, aqueles que decidiram por si próprios resistir e retomar sua própria História. Mas que após cinco séculos de genocídio e isolamento nos verdadeiros guetos que são as pequenas terras demarcadas e espremidas entre enormes fazendas, são poucos contra o latifúndio e um estado racista. 

Basta de massacre aos Guarani-Kaiowá!

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