terça-feira, 29 de novembro de 2011

Nossas convicções e nossas polêmicas - para debate de chapas no CACH - Unicamp


por Biro Fardin - militante da Juventude ÀS Ruas - Campinas

     Passamos hoje por um processo eleitoral em meio a importes lutas em curso, e felicitamos o fato das três chapas que estão concorrendo para o CACH estarem participando destes conflitos. Este cenário para nós é muito rico, pois possibilita um debate vivo e sincero entre as chapas neste momento onde os estudantes deverão escolher quais serão as prioridades do movimento estudantil do IFCH para o próximo ano, e como este deverá se posicionar frente aos próximos processos de luta. É neste sentido que gostaríamos de aqui deixar claro nossas diferenças com nossos concorrentes que apresentam programas e concepções distintas para o movimento estudantil e para o CA.



    Com os companheiros da chapa “Para Além dos Muros”, composta integralmente por militantes do PSTU, nossas principais diferenças estão contidas centralmente em como encaramos o programa político e sua prática política com o movimento. Este grupo teve durante todo o ano, e ainda tem apostado todas suas fichas na campanha dos “10% do PIB para educação”. Esta campanha superestrutural sobrevoou através do discurso por sobre todos os processos de luta para finalmente aterrissar ao final do ano na forma de um plebiscito. Uma campanha que, munida de um discurso de “evitar lutas reais agora para fazer uma muito maior no futuro”, em nada ajudou para unificar as diversas lutas que aconteciam nacionalmente, travadas por estudantes e trabalhadores, e muito menos para levá-las à vitória. Serviu apenas para encher urnas, o que, em um futuro longínquo irá garantir, quem sabe, boas eleições para os partidos envolvidos na campanha (PSTU e PSOL), sem questionar minimamente os aspectos mais reacionários do projeto de educação elitista e racista vigente em nosso país.
    Somos sim a favor de mais financiamento para educação pública, mas, ao contrário do que esta campanha ofereceu ao movimento, nossa prioridade é com os processos de luta em curso (greve dos funcionários da Unicamp e greve geral dos estudantes da USP), intervindo nestes para que sejam vitoriosos e para que seus sujeitos saiam mais fortalecidos para os próximos conflitos, nos armando com um programa claro que questiona as entranhas do projeto de universidade e o conjunto da educação atual.
    Esta chapa também vem criticando nossa concepção de entidade, uma entidade que milite dentro e fora da universidade. Na realidade esta divergência tem sido alimentada por verem um antagonismo entre mobilizar-se e mobilizar os estudantes, entre participar ativamente das lutas e “passar em salas de aula para dialogar”. Nós não vemos desta maneira, e não nos ausentamos de ambas as tarefas. Pelo contrário. Nossos esforços serão sempre de ligar a base dos estudantes a todos os processos de mobilização e de organização do movimento estudantil, e a todos os processos de luta, dentro e fora da universidade. Esta concepção de adaptação ao imobilismo, que propõe objetivos para as lutas de mudanças puramente cosméticas, faz com que hoje, em meio à brutal repressão na USP, que fez 73 presos políticos sofrendo inquéritos e punições, ao invés desta chapa defender ferrenhamente estes militantes, aliado a uma luta principista contra a policia no campus, acata as pressões do senso comum de desvio da questão essencial (papel da polícia) para palpitar sobre alternativas de segurança para uma universidade de elite cuja estrutura está voltada, com a polícia como com a “guarda” a neutralizar o ativismo operário-estudantil (algo como uma combinação entre o “condomínio fechado da universidade” com uma “guarda comunitária” que dispense a polícia, nunca acertando o central do debate que é: não separar os efetivos da guarda de quem as comanda).
    Já com os integrantes da chapa “Intergaláticos, Uni-vos!” nossas diferenças ganham bastante contraste na concepção de entidade e na importância com que vemos o programa. Embora os integrantes desta chapa estejam, majoritariamente, atuando ativamente na greve numa perspectiva bastante combativa, parecem não dar importância para um programa político que se enfrente frontalmente com o elitismo, a exploração e as opressões presentes em nossa universidade, assim como fora dela, como elemento constitutivo de uma chapa para o CA. Acabam, com “propostas prático-programáticas”, confundindo programa político com formas de gerenciar o CA. Deslocando o debate orientador do movimento estudantil, “precisamos ser vitoriosos em nossas lutas!”, para um debate sobre “como aproximar os estudantes do CACH” sem apresentar-lhes uma proposta política pela positiva. Embora esta chapa tenha superado a atual gestão do CACH, “Independência ou Marte”, no momento em que parte de uma análise política e crítica do projeto de universidade atual, acaba reproduzindo os mesmos erros desta gestão, onde mobilizar os estudantes e “para o que” mobilizá-los se tornaram momentos distintos, e o resultado é que não só o conteúdo político da intervenção da entidade se enfraqueceu como o princípio de mobilizar mais estudantes e criar novos espaços também não é atingido, fazendo com que uma das chapas eleitas com maior número de apoiadores fosse a de menos membros ativos durante o ano, permanecendo distante das lutas dentro e fora da universidade, como a ocupação da administração da moradia, o comitê contra os estupros, a greve das trabalhadoras terceirizadas da USP e da Unicamp, greve dos trabalhadores dos correios e dos bancários. Esta ausência, que se expandiu inclusive para boa parte dos estudantes mais ativos do IFCH, se deu fundamentalmente por não terem um programa político e uma proposta clara de prioridades de que luta levar a diante. O fato de não atestarem programaticamente a centralidade da unidade de atuação com os trabalhadores, mesmo que involuntariamente, revela o não-reconhecimento de sua importância.
    A partir da concepção de programa que está vinculada com o papel que um centro acadêmico deve cumprir também nos diferenciamos. Partimos de que a universidade surge das entranhas de uma sociedade dividida em classes, entre explorados e exploradores, oprimidos e opressores. Neste sentido, mais do que aproximar os estudantes combativos, que vêem no CACH uma oportunidade de se organizarem e serem sujeitos dentro da universidade, é também tarefa deste se posicionar claramente diante dos interesses inconciliáveis de tais classes. Por isso para nós o programa de um chapa deve ser claro e ponto de partida. Nós da chapa Nosso Canto é Navalha temos em nosso programa a defesa intransigente dos trabalhadores (os construtores e preservadores da universidade), a aliança operário-estudantil, o resgate da tradição militante da entidade (que esteja voltada para a luta, e proponha discussões amplas com os estudantes e setores ativos), a defesa da radical democratização do acesso e da derrubada da estrutura de poder da universidade, pois achamos que a futura gestão do CACH deve se posicionar ao lado de todos os explorados e oprimidos, sendo a voz destes dentro da universidade e que milite por seus interesses. O critério que impulsiona nosso programa não está fundado em sua aplicabilidade imediata ou não, mas em que avança a consciência dos estudantes num sentido progressivo, para que se coloquem à altura dos desafios grandiosos que a luta de classes promoverá dentro de uma das estruturas mais cruciais da sociedade atual, a universidade.
    Neste sentido todos os novos espaços que produzirmos devem ser também um espaço para os trabalhadores, cada debate que fizermos, será um debate contra o machismo, o racismo e a homofobia e cada luta que travarmos deve ser uma luta de toda a juventude oprimida e explorada. Os companheiros da chapa “Intergalácticos, Uni-vos!” parecem não ver essa necessidade, e mais ainda, não vêem que para isto é necessário uma dura luta cotidiana. Suas propostas de “criar novos espaços de participação” acabam por findar em si mesmos, como se a reprodução vertiginosa destes por si só fosse capaz de questionar o projeto de universidade que temos hoje. A ideia da “auto gestão” do centro acadêmico que defenderam como meta, e já reproduzem nesta chapa, acaba, na tentativa de multiplicar os espaços de participação dos estudantes, retirando um escasso e privilegiado espaço que seja, antes de mais nada, uma trincheira da juventude, dos negros, das mulheres, dos homossexuais, dos trabalhadores, e também dos estudantes, pois temos a convicção (e experiência dos anos anteriores) que somente uma entidade militante pode mobilizá-los realmente!
    Sabemos que boa parte dos estudantes hoje possuem seus desafios particulares, alguns trabalham, ou então possuem ilusão de que se seguirem a academia à risca terão um bom futuro lhes esperando ao final do curso, acabam por não se fazerem presentes nos espaços deliberativos do CACH. Tendo isto em vista um centro acadêmico auto gestionado, sem um programa, acabaria, na tentativa de colocar suas prioridades e seu programa nas mãos de um amplo setor de estudantes participativos, na verdade nas mãos de uma vanguarda restrita, dando um caráter burocrático àquilo que deveria ser democrático. Por isso achamos necessário que o programa e as prioridades que serão levadas adiante na futura gestão seja escolhido em um espaço amplo e democrático, vinculado aos processos de luta, tal qual é o processo eleitoral em que estamos. Entretanto não somos pessimistas em relação à base dos estudantes. Pelo contrário, sabemos que são capazes de se mobilizar fortemente quando as tarefas que lhe são colocadas são grandiosas. Exemplo disto é a atual mobilização em solidariedade aos trabalhadores da UNICAMP e aos estudantes da USP, onde, mesmo após um ano de relativa passividade, foram capazes de produzir assembléias massivas para deflagrar esta importante greve. E nestes momentos defendemos que o centro acadêmico se dissolva na mobilização, deixando que as assembléias e os organismos de auto-organização dos estudantes encaminhem suas lutas livremente através da democracia direta. Isso não quer dizer que a democracia direta deve existir apenas em momentos de luta. Acreditamos que a tarefa de qualquer entidade é garantir a soberania das assembleias, submetendo-se a suas decisões, fortalecendo os mecanismos de democracia direta, combatendo qualquer tipo de burocratismo, garantindo que as diferentes posições se expressem da maneira mais democrática e clara possível. Nossa chapa reivindica o método de direção de luta utilizado hoje na USP, de delegados revogáveis e eleitos pela base, que garante que todas as posições possam se expressar democraticamente, principalmente a dos militantes independentes, subordinando os rumos da mobilização às assembleias de curso.
    O discurso de “novas formas”, “novos espaços”, “novos métodos”, muitas vezes vêm com a justificativa de criar um “novo movimento estudantil”, não burocrático e dinâmico. Nós da chapa Nosso Canto é Navalha também queremos construir um movimento estudantil nesta perspectiva. Mas mais do que isso, queremos um movimento estudantil que tenha como exemplo as tradições combativas e pró-operarias de toda historia, como foi Maio de 68, mas agora, com uma estratégia que vença! Isto é o novo. Que aprenda a tirar lições das lutas da juventude internacionalmente, como a magnífica luta dos estudantes chilenos por uma educação gratuita e de qualidade para todos, ou dos estudantes egípcios que lutam para derrubar o poder militar. Que reivindique os métodos radicais e a democracia direta. Neste sentido hoje temos a greve dos estudantes do IFCH como um exemplo que queremos continuar, aprofundar e aperfeiçoar no próximo ano.

1 comentários:

Muito bom, Biro!

Essa separação entre "mobilizar" e "para o que mobilizar" se expressa bastante também nas posições das chapas Aroeira e Despertar..., na eleição do CEUPES-USP. Boa análise!

Abraços,
Caio

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