terça-feira, 12 de junho de 2012

As eleições do CAECO e a necessidade de construção de um novo Movimento Estudantil

Intervenção da Juventude Às Ruas! para as eleições do Centro Acadêmico de Economia da Unicamp, no qual propomos abrir uma reflexão política com o conjunto dos estudantes sobre  projeto de universidade burguês e o papel da juventude em aliança com os trabalhadores de subverte-lo. Quais são as tarefas colocadas para uma gestão de CA na Unicamp, umas das universidades de excelência para a burguesia? É necessário um novo tipo de movimento estudantil diante do cenário nacional de greve das federais, e os diversos processos de repressão e punições aos lutadores nas estaduais paulistas.




No Brasil onde apenas 14% dos jovens de 18 a 24 anos cursam o ensino superior e 75% desses estão nas faculdades privadas. Para quê servem as universidades públicas brasileiras? Universidades de “excelência” e de “democratização do acesso ao ensino superior” ou de precarização?


Dois acontecimentos recentes marcaram o movimento estudantil brasileiro: a greve ainda em curso das universidades federais – a maior mobilização conjunta das universidades em cerca de 30 anos, são 49 de 57 universidades mobilizadas- e a greve contra a repressão na USP no ano passado. Mobilizações que se enfrentam com as duas faces do ensino superior público brasileiro. Os exemplos da díade da educação para os capitalistas: bolsões de formação de mão-de-obra barata de um lado, e de outro, um polo de excelência elitizado.
 De um lado está a faceta do REUNI, de expansão e “democratização do acesso” ao ensino superior, com o surgimento de novas universidades federais e novos campi, mas com a contradição de uma expansão baseada na precarização e na terceirização do trabalho, propulsor do que estamos observando hoje nas greves: universidades sem infraestrutura mínima para as aulas e sem projeto de permanência estudantil, sem bibliotecas, sem moradias e restaurantes universitários gratuitos, com precarização da atividade docente – o governo criou uma categoria de professor associado que o piso salarial é de 923 reais, os salários da categoria de professores tem grandes discrepâncias regionais e os funcionários efetivos também com salários desvalorizados. Do outro, a USP enquanto um projeto de universidade de excelência, cada vez mais privada e elitista, entrando para os rankings internacionais de melhores universidades e estabelecendo relações com grandes empresas multinacionais, assim como na UNICAMP, a contrapartida da "excelência" na USP é o avanço na terceirização que se mostra hoje como um dos pilares desse projeto de universidade num país semi-colonial e dependente dos grandes monopólios imperialistas como o Brasil.
Nesse sentido, a universidade pública, é reflexo da estrutura atrasada de um país de capitalismo tardio e servil, incapaz (fundamentalmente na atual época histórica do capitalismo, o imperialismo), de completar o processo de democratização plena do acesso a educação pública, gratuita e de qualidade da creche ao ensino superior; o filtro do vestibular e a profunda exclusão dos negros e pobres da universidade pública escancaram o seu caráter estrutural elitista, racista e excludente. Porém esse caráter entra em contradição com um Projeto de País Lulista/Dilmista que impõe, para atender aos interesses dos grandes monopólios imperialistas (e de setores da burguesia nacional – FIESP, CNI), a necessidade de expansão radical da formação de mão de obra especializada e barata, ao mesmo tempo em que um “país potência” e que “avança” para os interesses privados, exige que se desenvolvam novos projetos inovativos para a grande indústria nacional (em especial a Petrobras – Pré-Sal) e para atrair investimento estrangeiro em tecnologia de ponta a que levaria ao “desenvolvimento e autonomia” do país. Dessa forma, o “Brasil potência” está imbricado na universidade pública em todo o processo de expansão precarizada via REUNI, que cumpre o papel de uma formação mais ampla de mão de obra técnica, e nas universidades de excelência que são polos nacionais da inovação, a função de geração de mão de obra altamente capacitada para as grandes transnacionais e órgãos do governo.
Ambos os projetos, também possuem como um de seus pilares, a privatização da universidade que se evidencia nos cursos pagos em universidades como a USP e UNICAMP, em cortes de vagas para os cursos “menos produtivos” e com menor “demanda do mercado”, estruturas pedagógicas voltadas à formação especializada direcionada às necessidades do “mercado de trabalho”, o que ideologicamente se reverte para os interesses privados e não para as necessidades dos trabalhadores e oprimidos, na perspectiva de resolver  os problemas brasileiros. O REUNI e as universidades de excelência não podem ser concebidas sem combinarem precarização do trabalho, cuja terceirização que divide e semiescraviza a classe trabalhadora (tanto na construção civil quanto nos serviços básicos da universidade como limpeza, segurança, alimentação) é a face mais bárbara, com uma série de demais ataques aos trabalhadores da universidade, como as punições e demissões políticas aos lutadores, repressão ao movimento estudantil, desvalorização salarial e quebra de isonomia, além da precarização do trabalho docente.

A Unicamp entre as 100 melhores do mundo localizada no Vale do Silício brasileiro

O site da Unicamp de quinze dias atrás trazia como destaque duas matérias: a primeira que de acordo com a agência londrina Times Higher Education a Unicamp se localiza entre as 100 melhores universidades do mundo, em 44º lugar; a segunda de uma matéria no jornal Folha de São Paulo de um executivo estadunidense dizendo que pela concentração de indústria, conhecimento e pelo potencial inovador dos pesquisadores da Unicamp, esta seria comparada ao Vale do Silício nos EUA.
Nos últimos anos temos visto o aprofundamento do projeto de universidade de “excelência” da Unicamp que no seu entorno terá dois parques tecnológicos com empresas e multinacionais instaladas, tais como P&G, Santander, entre outras; agências de inovação como a INOVAUnicamp e pesquisas sendo patrocinadas por empresas estrangeiras e nacionais, no IE, dentre muitos outros. Sabemos que a Vale S.A. encomendou uma pesquisa em 2010 ao NEIT. Outro aspecto, da privatização do espaço público da universidade além do conhecimento gerado por ela, se mostra na Unicamp, pelo aluguel de salas de aula para cursos de extensão pagos, como ocorre no IE, para cursos voltados às finanças corporativas. É conhecimento gerado com um esforço social, mas com uma apropriação privada. A prioridade destes projetos se reverte em precariedade para os trabalhadores e estudantes e em maior controle, repressão e punição a estas categorias que se coloquem contra este projeto: com o sucateamento das políticas de permanência estudantil – moradia estudantil e bandejão-, com precarização que significa a falta de funcionários nos diversos institutos que são substituídos por estagiários (o IE não está fora desse processo), e a terceirização de serviços de limpeza, alimentação, segurança e construção civil. Este último, já foi alvo de denúncias pelas péssimas condições de trabalho impostas aos trabalhadores que não possuem locais adequados para descansarem e almoçarem que fazem coro com a precariedade que envolve o processo de terceirização em geral.
A UNICAMP está se tornando um verdadeiro canteiro de obras, cuja principal construtora, a Delta, é uma das principais envolvidas no escândalo de corrupção “Cachoeira” que revela ligações espúrias da reitoria, governo do estado e prefeitura de Campinas com a lama da corrupção da burguesia brasileira. É preciso desmascarar o verdadeiro caráter dessas obras, dentro do projeto de “Unicamp de excelência” que visa projetar a universidade internacionalmente e incentivar pesquisas com novos laboratórios, visando investimentos privados das transnacionais que buscam na região Metropolitana de Campinas, altos lucros e uma mão de obra especializada e de alto nível técnico.

E o IE nesse projeto?

O IE é um dos institutos mais importantes da Unicamp dentro da função de uma universidade para a burguesia do ponto de vista de peso em decisões políticas, de geração de pesquisa e conhecimento e de formação de dirigentes da burguesia a nível federal e estadual e pesquisadores cujas análises são  fundamento para as políticas públicas adotadas a nível municipal, estadual ou federal. Dilma Rousseff, José Serra, Aloizio Mercadante, Mariano Laplane, Marcio Pochmann, professor e pesquisador do CESIT, ex-presidente do IPEA, hoje é o atual candidato à prefeitura de Campinas pelo PT, partido que já se envolveu em escândalos de corrupção na cidade.
 Dessa forma vemos a ligação estreita entre a teoria econômica e as políticas pensadas para as grandes empresas estrangeiras (por meio dos parques tecnológicos) e para o Estado burguês brasileiro. Projeto este defendido por uma parcela de professores do IE, os mesmos que elaboram e/ou assessoram as políticas sociais, industriais e de inovação e tecnologia do governo Lula/Dilma e que defendem o projeto de país da terceirização e do alinhamento com os interesses dos grandes monopólios imperialistas.

As marcas da universidade do Brasil potência: resquícios da ditadura e profunda precarização do trabalho

A implementação de um projeto de “universidade de excelência” atendendo a níveis internacionais num país dependente como o Brasil só pode vir com ataques, repressão e punição “com mãos de ferro” ao movimento dos trabalhadores e ao movimento estudantil que se colocam numa perspectiva contrária a privatização, a precarização do trabalho e das condições de estudo e a elitização da universidade. Nesse sentido a estrutura anti-democrática herdada da ditadura tanto no que tange ao código que pune os estudantes – na Unicamp temos um artigo do regimento sempre utilizado pela reitoria em punições que é cópia do AI-5- quanto às estruturas de decisão da universidade – seja numa instância mais próxima com as congregações de institutos e faculdades; seja a nível da universidade como um todo, com o CONSU (Conselho Universitário órgão de deliberação máxima com  70% de representação para professores e o restante divido igualmente entre funcionários e estudantes)- é a garantia de que os ataques com privatizações, reestruturação de carreira, acordos com a burguesia internacional e nacional sejam decididos pela maioria da burocracia acadêmica, cujos interesses estão estreitamente atrelados ao de empresas e governos – a já citada relação da Delta com as construções e compras de terrenos pela Unicamp são exemplos disso.
Na USP, por exemplo, um comitê de estudantes, professores, trabalhadores e parentes de mortos e presos políticos da ditadura está organizando uma Comissão da Verdade da USP para investigar as ligações da USP e de sua reitoria com a ditadura, questão que levanta a necessidade de uma ampla campanha contra a repressão e por democracia na universidade.
Os resquícios da ditadura vão mais além, a implantação de uma base da polícia militar na USP, a presença de policiais militares fazendo ronda tanto na USP como na Unicamp e entrando no campus para reprimir mobilizações estudantis e de trabalhadores, nomeando ex-coronéis para fazerem um plano de segurança para a USP. A polícia cumpre um papel central e estrutural num país onde a desigualdade social é gigantesca e a luta de classes está latente, inclusive na universidade.

As mobilizações internacionais e a crise econômica: cenário que nos coloca desafios e reflexões

Embora o epicentro da crise seja na Europa, os ventos de todas as manifestações europeias e da juventude árabe tem atingido a América. Com a mobilização da juventude chilena por uma educação pública e gratuita, com o movimento Ocuppy WallStreet nos EUA, a juventude em Quebéc no Canadá fazendo mobilizações que chegaram a 300 mil pessoas contra o aumento de 82% que o governo queria aplicar na mensalidade das universidades e no México, onde todo descontentamento com a situação nacional e as relações dos presidenciáveis com a mídia fez com que explodisse uma grande mobilização da juventude.
A juventude e o movimento estudantil vem adquirindo uma grande importância no cenário internacional, ao contrário do que se dizia, de uma juventude perdida, mas o que se vê é uma juventude que se mostra como um importante ator político, se colocando numa perspectiva de mudança. Nesse cenário, qualquer discurso acerca da passividade, neutralidade e impotência da juventude não pode resistir à prova. No Chile e no Canadá – considerado um país de primeiro mundo e países exemplo para o Brasil - as mobilizações estudantis colocam um cenário de crise para o padrão de educação neoliberal, de sucateamento e privatização completa da educação, transformando-a em mercadoria, se colocando por uma educação pública e gratuita e contra aos aumentos abusivos nas mensalidades estudantis. No México, o que está colocado é um cenário de crise nacional na campanha presidencial ainda em curso, a relação de um dos candidatos com a mídia burguesa do país foi o estopim para a mobilização juvenil e estudantil contra um projeto de país completamente dependente, com elevado número de desempregados, de trabalhos precários, combinada com a brutalidade da polícia, dos feminicídios – os assassinatos brutais às mulheres são comuns nas cidades mexicanas- e do narcotráfico.
Em todas essas mobilizações o Estado não falhou, reprimindo exemplarmente, prendendo estudantes, inclusive assassinando-os (no México, um estudante foi morto numa outra mobilização) inclusive em país tidos como exemplos de “desenvolvimento” como no Canadá, onde 700 estudantes foram presos no final de abril desse ano. A polícia aparelho repressivo do Estado burguês e pilar de sustentação deste, mostra toda a sua necessidade em momentos de acirramento de lutas de classes internacionalmente.

Qual é então, diante desse cenário, o projeto e a função da gestão um centro acadêmico?

Nesse sentido, partindo daquilo que temos como cenário internacional e nacional e de projeto de universidade, para nós da Juventude às Ruas o CAECO deve sim se colocar e ser a contracorrente de todo esse projeto, propondo e discutindo junto aos estudantes e trabalhadores uma alternativa que se contraponha a esse projeto visando, nesse cenário cada vez maior de polarização, que não há mais espaço para o discurso do “apolítico” e do “apartidário”: há que defender a democratização radical da universidade, e não aquela feita nos moldes do REUNI, para que todos possam ter acesso a um ensino superior de qualidade, para que a juventude pobre não tenha que se endividar para pagar por uma educação completamente precarizada nos grandes monopólios como Anhanguera, lutando pelo fim do vestibular e pela estatização das universidades privadas, e ajudando, com clareza política, que toda a juventude que está fora da universidade seja sujeito estratégico para a garantia do direito elementar de cursar o ensino superior, ligando-nos à juventude secundarista e dos colégios técnicos.
Democratização não apenas do acesso, mas também da estrutura de funcionamento da universidade. O corpo de burocratas parasitas das Reitorias e Conselhos Universitários, que governam a universidade para a burguesia com os regimentos de 1972 da ditadura militar, tem de ser eliminado. A gestão da universidade deve ser realizada por professores, trabalhadores e estudantes num governo tripartite e de maioria estudantil, deve ser de fato democrática, como uma conquista elementar da democracia burguesa: cada cabeça um voto é condição necessária para se voltar o conhecimento gerado na universidade e seu espaço de fato para os interesses da maioria da população, do conjunto da classe trabalhadora, dos negros, pobres e oprimidos.
Nesse sentido, o CAECO deve se colocar firmemente contra a punição e repressão aos trabalhadores e estudantes em luta, como no caso dos processados da USP e da Unicamp e em defesa e solidariedade ativa a esses lutadores, mostrando ao conjunto dos estudantes essa necessidade urgente.
Diante do cenário de precarização e de ataques aos trabalhadores e estudantes, de terceirização do trabalho, acreditamos que o centro acadêmico tenha que dar a resposta apoiando ativamente os trabalhadores, suas mobilizações, se colocando contra a terceirização do trabalho e pela efetivação dos terceirizados sem concurso público porque esses trabalhadores já mostram que são capazes de cumprir suas funções diariamente.
Como mostram as mobilizações internacionais desde o Egito onde a juventude desempregada e faminta junto aos trabalhadores saiu às ruas por democracia derrubando a ditadura de Mubarak, assim como em maio de 1968 e no Cordobazo* na Argentina que já faz 43 anos, nos quais a juventude se colocou firmemente ao lado dos trabalhadores para responder aos ataques dos governos numa aliança combativa que deve ser exemplo de como a juventude deve se colocar em luta, tento em perspectiva que seus interesses não podem se descolar do conjunto da sociedade partindo de um questionamento profundo da opressão do sistema capitalista. No Chile, a juventude percebeu que era preciso ir por mais, chegando até o questionamento da herança da ditadura pinochetista e toda a sua estrutura repressiva, em Quebéc e no México, a repressão do estado burguês neoliberal não é diferente e impõe aos jovens desafios ainda maiores. No Brasil, que ainda carrega as marcas de sangue da ditadura em suas instituições e na Universidade pública, estes desafios só podem ser respondidos por meio da aliança operário-estudantil e com o povo pobre. É nessa perspectiva e  inflamados pelas mobilizações internacionais e no Brasil, nas greves dos trabalhadores da construção civil e nas greves dos professores e estudantes das federais contra a precarização, que a Juventude às Ruas atua na universidade, e que convidamos os estudantes do IE a uma profunda reflexão sobre o papel da Universidade e fundamentalmente, do potencial da juventude de transformação junto a classe trabalhadora.

É fundamental que os estudantes do IE tenham expressado em seu C.A. o ímpeto de colocar seu conhecimento, e todo aquele que é produzido neste instituto, não a favor dos grandes monopólios e seus governos fantoches, como propõe os diretores e burocratas acadêmicos, mas sim a serviço da população e da juventude, dos trabalhadores e estudantes, para que encontrem em suas próprias forças uma saída independente e revolucionária para a crise do capitalismo.

*Veja mais sobre o Cordobazo na Argentina nos links: http://www.pts.org.ar/spip.php?article17846; http://www.tvpts.tv/Giro-a-la-Izquierda-Especial-sobre-El-Cordobazo

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