O regime universitário será responsável por muitas "bibliotecas de Alexandria"
por Fernanda Montagner
A biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem arde em chamas.
Infelizmente essa não é mais uma analogia viva de um poeta, mas sim, a
realidade crua da Unicamp. Essa biblioteca (uma das mais importantes da
Unicamp com 1.725 metros quadrados, incluindo um acervo que conta com
105,6 mil livros, 1,5 mil títulos de periódicos e 3,2 mil teses e
dissertações) sofre o calvário compartilhado por diversas outras, as
próximas "Alexandrias". Os livros e documentos mais uma vez se perdem em
meio às entranhas de uma universidade de elite para a elite, depois da
inundação de dezembro de 2012 no IEL, que mergulhou um imenso arsenal de
ideias documentadas no charco das goteiras, da infiltração e da fraude
das empresas terceirizadas. É preciso questionar e por abaixo a
estrutura de poder responsável por essas catástrofes. Um dos maiores
monumentos da herança cultural da humanidade é refém da camarilha
universitária que dirige o acervo. Mais: as vidas trabalhadoras estavam
em risco se este incêndio acontecesse em horário expediente!
De costas para a população, dá milhões de reais a construtoras
terceirizadas, que demoram anos para terminar seus prédios, quando não
entram em falência ano após ano supostamente para pegar o dinheiro e
entrar outra empresa fantasma, construindo seus elefantes brancos e
cheios de problemas estruturais que colocam em risco funcionários e
estudantes que utilizam os prédios. Para além disso, há o fato de que
essas construções são erguidas pelos braços de trabalhadores
terceirizados, os mais explorados, que sofrem acidentes de trabalho e
ganham uma miséria, sendo estes mesmos trabalhadores da construção civil
que são ainda usados pelo governo para construir as obras da Copa e do
PAC e que vem cada vez mais se levantando em Jirau, Belo Monte e outro
locais (como os 16 operários ora presos no Amapá), contra as bárbaras
condições de trabalho a que são submetidos. E a Unicamp, uma
universidade pública de "excelência", é conivente com esse tipo de
regime de trabalho.
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Graças ao trabalho de alguns funcionários, o fogo não se alastrou para
as salas onde ficam os acervos. Mesmo assim, as chamas destruíram as
salas de trabalho e alguns livros que estavam nesses locais, tendo que
novamente os funcionários e estudantes cuidarem dos acervos, como foi na
inundação da biblioteca do IFCH em 2009, ou mesmo na recente inundação
do IEL em 2012, enquanto os guardinhas da reitoria apenas tiravam fotos,
as mesmas que são tiradas do movimento estudantil e dos trabalhadores
para reprimi-los depois. Esse é o projeto privatista e elitista da
reitoria, que o próximo reitor eleito (pelas ligações espúrias da
Universidade com o governo do Estado e o interesses de grandes
empresas), buscará manter como pilar estável deste regime universitário.
Enquanto busca intensificar sua política repressiva, com as punições na
USP e a ligação com o Ministério Público para acusar estudantes e
trabalhadores de formação de quadrilha, volta a universidade de
excelência para as grandes empresas monopolistas e bancos, como o
Santander, colocando o conhecimento a serviço destas (e de suas
chamas!), ao relegar os acervos a prédios sem manutenção e impedir que a
população tenha acesso a estes na medida em que mantem o vestibular,
como filtro para que a juventude pobre e da periferia não coloque os pés
na universidade (restringindo com "a biometria" o uso público das
bibliotecas aos estudantes, funcionários efetivos e professores da
Unicamp).
É a estrutura de poder universitária, que junto aos governos do estado, é
responsável por esse incêndio, pelos acidentes de trabalho, por impedir
que a juventude e a população tenham acesso aos livros e ao
conhecimento produzido na universidade. Para estes senhores, é melhor
que os livros se percam, inundados e incendiados, a que sirvam às mãos
daqueles que movimentam as engrenagens da universidade e do mundo. É
fundamental que a intelectualidade e os estudantes repudiem este descaso
do regime universitário contra as obras e o trabalho dos funcionários
da universidade, cuja vida está em risco! Os centros acadêmicos e o STU
denunciem a terceirização numa luta intransigente contra a estrutura
universitária, para arrancarmos o conhecimento das mãos da elite
restrita e voltarmos verdadeiramente a universidade para a população,
para que os trabalhadores e a juventude tomem este espaço quanto seu por
direito.
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